quarta-feira, 20 de agosto de 2014

A Crônica Cotidiana de Hoje

... E aí que faziam umas duas semanas que ela estava cismada de que ele estava a observando, olhando-a e se aproximando mais do que nos semestres anteriores.
Ah! Naquele misto de solidão real com vulnerabilidade apoiada pela TPM, bastou que ele a olhasse nos olhos pela segunda vez (coincidentemente ou não) em menos de dez minutos e pronto! A flecha saliente de algum cupido equivocado, acertou em cheio a pobre e impulsiva garota.

Passado isso, as próximas aulas ganharam uma motivação a mais para ela. Cuidava-se mais do que de costume, prestava atenção nele, se ele dormia em aula, se ia ao banheiro, se mexia nos cabelos... (E ele mexia sim nos cabelos!) Ah! Como ela achava aquilo um charme.


O tempo todo observando, com olhos de cigana oblíqua porém nem tanto dissimulada, pra falar a verdade. Às vezes, tentava (e se esforçava) para considerar mais a razão do que a emoção. Tentava pensar que aquela sensação de desejo e atração, deveriam ser apenas ilusões, frutos de sua momentânea carência e de algumas trocas de olhares fatais, entretanto descompromissadas. 

Porém, mesmo tentando pensar assim, cada vez que ela o fitava em sala de aula, encontrava aqueles olhos tão vívidos e desinibidos sobre ela.
Arrepiava-se, ficava fria e além de tudo, não hesitava em fazer com que seu olhar para ele fosse notado, como se quisesse dizer com os olhos "Eu também estou te vendo".

Havia também uma certa preocupação, advinda de uma cena presenciada por ela, onde ele estava sentado de frente com uma garota, no banco da faculdade, conversando bem de pertinho, quase com os rostos coladinhos... Aquela cena a inibia algumas vezes, quando lembrada. Quem seria aquela garota? Será que ele a conheceu nas férias? Será que é namoro mesmo ou apenas uma amiga mais íntima? Será que ele é desses garotos que tem costume de andar de mãos dadas, abraçar e beijar afetuosamente amigas e amigos? Afinal, ela nunca tinha o visto com alguém... Mas quem era aquela garota bonita?


Um dia desses, ele a procurou. Queria doce, mas o doce que ela fazia para vender, e não o doce que ela estava há muito querendo apresentar à ele. Vendeu, ele comendo em sua frente: "Nossa, continua gostoso como sempre! Parabéns, está demais. Hummm..."

Aquela deve ter sido a quarta ou quinta vez, em dois anos, que ele comprava. E é claro que isso deu ainda mais asas à romântica imaginação dela. Era sim um tanto instigante que ele tenha comprado um doce dela. Uma colega de classe notou e comentou também, fazendo com que a doce garota dos doces não se sentisse tão iludida e paranoica, afinal se até outra pessoa notou que ele a procurou e comprou um doce, realmente havia algo interessante envolvendo tal situação.

Algumas horas depois disto, ela anunciou: "Pessoal, tem apenas mais um..." quando ele mais que depressa a olhou e disse: "Eu levo! Está muito gostoso, vou comprar este. Pode ser?"

Ela o olhou com vontade de suavizar a voz e dizer: "Claro, meu anjo, pode levar sim." Mas, claro que ela se colocou naquela fantasia invisível de menininha de parque e respondeu como uma criança:" Ah, pode, claro. Muuuito obrigada, viu?! E que bom que você gostou...". Sorriram um para o outro cordialmente. Ela o entregou o doce cuidadosamente ao mesmo tempo que tentava controlar o excesso de delicadeza ao se aproximar dele. Por mais que quisesse, tinha receio de deixar tão na cara.

Foi para a casa saltitante e guiando-o com os olhos até perdê-lo de vista, naqueles passos calmos com um jeito despojado de andar, largado como meninos que tocam reggae e mpb. Ainda era o fim de uma noite de aula, mas ela mal esperava pelo dia seguinte, ficava imaginando se ele estaria com aquela calça jeans gasta e rasgada no joelho ou com aquela bermuda legal, meio suja, se ele estaria com os cabelos lindos soltos ou se teria feito um coque como estava usando ultimamente. Se estaria com a de manga longa ou a de manga curta, ficava imaginando se ele falaria com ela quando entrasse ou se apenas sentaria-se num lugar vago sem notar que ela estava o observando, ficava ela imaginando.


O próximo dia de aula chegou. Ela entrou na sala com ar de serenidade e uma pitada honesta de amor pra dar.Olhou pelos lados e cadê ele? "Deve estar lá fora, fumando, ou nem vem hoje... Poxa." A aula começou, ela acompanhou, prestou atenção direitinho e por 2 vezes se lembrou dele e pensou sobre onde ele poderia estar. Ao final desta aula, que terminou mais cedo, ela foi até o refeitório e, como o pensamento tem força, quem ela encontrou no caminho? Ele! Com a bermuda legal, meio suja, de manga longa e coque. Ele olhou para trás, ela tentou fingir uma timidez de leve, ele a chamou pelo nome, porém de uma forma carinhosa e diminutiva, abraçou-a com um braço e deu-lhe um beijo de cumprimento no rosto. Esses pequenos e simples fatores,  deram à ela sensação de "somos íntimos". Deve ter sido a melhor sensação daquela noite. Deu-se um breve diálogo assim:


-Então, aaai, você trouxe mais coisas boas hoje?

-Sim, eu... - ele interrompe:
-hummm, (chamou-a do jeito carinhoso), e o que é que você tem aí hoje?
-Brownie com Nutella e Palha Italiana.
Ele ainda abraçando-a com um braço, começam a descer a escada quando ele diz:
-Acho que hoje vou levar mais um! Aquele dia eu levei, minha namorada gostou muito do seu brownie, adorou. 

...


Um choque e um raciocínio rápido acontecendo juntos dentro dela e então sem cerimônia e da forma mais natural que deu, ela respondeu:

-Nossa, que bom que sua namorada gostou! Leve mais um para ela hoje então, isso mesmo, na sala eu te dou, vou comer agora e a gente se encontra daqui a pouco.

Ela reproduziu esta última fala com um sorriso natural e meigo e uma expressão de contentamento. 

Ele sorriu, soltou o braço que estava envolvendo-a e foi para a sala, caminhando em passos largos e lentos, meio largado, como aqueles meninos que tocam reggae e mpb. 
E ela? Foi comer. Rindo da situação, rindo da ilusão, rindo de si mesma e de sua capacidade de fazer com que estórias como esta aconteçam de forma real na vida dela.


Ana Carolina C Pereira



























PS: Qualquer semelhança com a realidade, pode ser mera coincidência. ;)